Nicolelis escreve “neste livro, eu proponho que, assim como o universo que tanto nos fascina, o cérebro humano também é um escultor relativístico; um habilidoso artesão que delicadamente funde espaço e tempo neuronais num continuum em orgânico capaz de criar tudo que somos capazes de ver e sentir como realidade, incluindo nosso próprio senso de ser e existir.
Nunca vou esquecer de um estudo prolongado de filosofia que fizemos entre casais amigos na Escola de Marketing Industrial , coordenado por Jean Bartoli e nosso saudoso amigo Arthur Hipolito de Almeida. Entre outros temas eleitos como essenciais para nossos sábados de discussões existenciais um deles marcou muito pela conclusão desafiadora , do que seria a Verdade e como o conceito de Verdade e a Verdade propriamente dita muda e toma formas diferentes de pessoa para pessoa.
Um detalhe interessante: a etimologia da palavra verdade em grego: aletheia, o que significa literalmente: o que não se esquece. Nas nossas discussões, o que nosso desejo e nossos sentimentos nos fazem esquecer voluntariamente ou involuntariamente , mutilando nossa visão?
Bem , entendo que a Verdade em muitos momentos e situações está diretamente relacionada a noção de realidade , ou melhor , o que seja a realidade para quem se apropria dela como verdade.
Obra postumamente publicada do filósofo Arthur Schopenhauer, a qual recebeu o sugestivo título Como Vencer um Debate sem Precisar Ter Razão. Uma de nossas advertências era a seguinte: não acredite em histórias perfeitas, daquelas que têm explicação para tudo. A realidade não produz enredos perfeitos. Os que existem não passam de elaborações humanas.
Roberto Girola tambem contribui :
Se isso vale para a ciência, diante da qual costumamos nos inclinar em reverente obséquio, imaginemos o quanto faz sentido no nosso dia-a-dia, dominado por intermináveis discussões sobre quem está certo e quem está errado. Aliás, a “verdade” sempre anda em um dos nossos bolsos, pronta para ser exibida para quem for, toda vez que nos sentimos ameaçados pela “verdade” do outro. Frequentemente deixamos de ser felizes porque prevalece o desejo de estarmos “certos”. Defender a nossa verdade se torna uma prioridade absoluta, que nos impede escutar e dialogar com a “verdade” do outro. Quem sabe nossos horizontes poderiam se ampliar se pudéssemos ouvir a verdade do outro e perceber o quanto a nossa pode ser falível.
Já imagino que alguém comece a se perguntar: “Mas afinal existe a verdade?”. Tudo nos leva a pensar que a “verdade” existe, mas que talvez ela não seja exatamente como a imaginamos. Talvez esse comportamento bizarro das pesquisas científicas possa nos dar umas dicas quanto á maneira como o nosso desejo interfere com a verdade. De fato, do ponto de vista emocional, em um primeiro momento, o pesquisador está sob o foco do seu desejo, que é descobrir algo novo, útil e inusitado. No segundo momento, no teste da repetição, o que prevalece é o medo dele ter errado na primeira pesquisa, ou o desejo de achar o erro do colega, caso não seja a mesma pessoa que aplica o teste da repetição.
Será que o desejo do observador interfere com a forma como a realidade se mostra e portanto sobre a forma como o mesmo chega a conceber a verdade? Provavelmente sim. Ampliando o leque de sentimentos que podem interferir no nosso modo de ter acesso à realidade, podemos supor que qualquer sentimento pode interferir na percepção da realidade e mediar a nossa concepção da verdade.
Tudo isso é negativo? Absolutamente não, muito pelo contrário. Cada um de nós, a partir do seu mundo interno, “revela” um aspecto da verdade, seja ele norteado pelo medo, pelo desejo, pela ansiedade ou por qualquer outro sentimento. O único inimigo absoluto da verdade é a impossibilidade de pensar, pois ela nos remete aos objetos bizarros e opacos que abitam a nossa mente e fragmentam inexoravelmente a realidade e a nossa concepção da mesma.
Pois no final desta discussão sempre me vem à mente a questão que incomoda : Existe uma verdade que desafia as demais que é a Verdade personificado na Deus encarnado , o Cristo ( Eu sou a verdade e a verdade vos libertará!) ? E qual o sentido da liberdade para o homem na sua fragilidade e finitude com base na verdade da promessa ?
Entendo que a palavra Verdade nunca será um sinônimo completo de si mesma se não considerar o contexto onde esteja sendo considerada e defendida por quem quer se seja. Do ponto de vista humano um verdade unica não pode existir sob pena de inviabilizar a convivência civilizada e pacífica , mesmo em família. Por outro lado no contexto religioso esta verdade pode tomar forma de Dogma e este por si só inviabilizar a comunicação entre semelhantes !
Prefiro pensar que a verdade será relativa sempre , daí a fragilidade da justiça humana. O ponto de vista será verdadeiro para um e não apra outro . A Tolerância pela diferença é o exercício que é penoso mas eficaz para este paradoxo humano. O perdão sempre a solução para os impasses que não chegaram a conclusão ou consenso.
Marcos C. Ribeiro
José Jorge Ribeiro da Silva
14/09/2012 at 19:09
Não estaria a verdade vinculada à palavra “…se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo…” uma vez que a relatividade, quanto á verdade, está presa à nossa natureza meramente humana? E a nossa visão dos fatos sempre desejosa em se impor, mesmo que vista “como por espelho” até que a encaremos virtuosamente, a despeito de nós mesmos? Não quero discutir nada, apenas expor mais uma vertente… Gostei do teu artigo.